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Transforming Energy
Exposição individual e residência artística
Burgh-Haamstede, Paises Baixos
julho/agosto de 2022




















                            Em janeiro de 2021 incorporei o projeto "The future has many histories" (em português, "O futuro tem muitas histórias") pelo instituto Stichting Bewaerschole, em Burgh-Haamstede, Paises Baixos, que propunha um programa de 14 artistas de diferentes nacionalidades. A ideia era que cada artista visitasse a ilha individualmente para montar uma exposição individual e que se inspirasse nos arredores para a criação de uma obra de arte em espaço público.  
                           
                          Selecionei um texto que eu havia escrito fazia pouco tempo e criei uma animação baseada nele ao longo de 2021 a partir de pinturas que eu vinha fazendo, no final foram 12 pinturas de diferentes tamanhos e formatos que utilizei no processo dessa animação. Passei o ano todo e a primeira metade de 2022 criando as imagens que comporam a instalação "Transforming Energy". Uma grande cabana que montei com mais de 30 lensois e toalhas de mesa que garimpei na ilha, comportava confortavelmente cerca de 20 pessoas dentro, onde passava a animação projetada em um dos lensois.

                           Durante minha residência me deram uma bicicleta para explorar. Burgh-Haamstede tem dunas e praia, no verão o sol se poe no mar as 22h. Na praia aparecem veados correndo nas dunas e muitas pipas no céu, venta contantemente. Filmei uma criança aprendendo a empinar pipa e acabei fazendo uma animação, pintei os frames no muro do jardim do Stichting Bewaerschole, fotografei e fiz uma animação da cena. Todas as noites um projetor é aceso e a projeção fica passando pra frente da rua. A instalação desse projeto foi feita posteriormente a minha estadia, portanto não tenho bons registros além do que me mandaram.

Mural com os frames da animação, Burgh-Haamstede



O poder da poda




                           Cortei alguns galhos bem rente ao caule de algumas flores do jardim, a única que sei o nome é a Rosa, que por sua vez é vermelha.

Peguei muitos galhos da florzinha coletiva, chamo ela assim porque suas flores são na verdade formadas por minúsculas florzinhas menores e maravilhosas, que vão mudando de cor a partir do momento em que são polinizadas. Eu não tenho certeza dessa informação, mas o Fernando me contou que as flores do manacá mudam de cor quando já foram polinizadas, quase que como se fosse um aviso aos passarinhos e insetos que gostam dela, e eu simplesmente imagino que também seja o caso da florzinha coletiva, que sempre vi como um buquê de flores para as fadinhas invisíveis e as borboletas que sempre a frequentam.

Quando eu era criança eu pegava um punhado dessas florzinhas e abençoava as pessoas dando um sopro nelas, fazendo o papel do vento.

Tenho me intrigado muito com o vento inclusive, a coisa invisível que é assimilada por todos como real (porque de fato é), mas acho intrigante como a pesar não enxergar o vento, posso senti-lo e acompanha-lo em seu ir e vir.

O vento é a prova de que a terra constantemente busca seu incansável equilíbrio, tentando preencher todos os vazios e equilibrando os restos deixados.

Ele me consola porque se nem a própria terra encontrou seu equilíbrio ainda, tudo bem se eu for desequilibrada também.

A flor que de fato é rosa eu não sei o nome, e ela parece uma espécie de rosa sem espinhos, que nasceu sem ninguém pedir aqui na grade. Elas nasce principalmente pro lado da vista, mas cada vez que volto eu vejo novos ramos dela crescendo pro lado de casa. 

Minha mãe sempre gostou de arranjos ornamentais, e por conta disso sempre vivi tentada a colher as flores que me cercam. Quando descobri que cada espécie tem um abiente propício para sobreviver, comecei a prestar mais atenção nas plantas que vieram parar aqui por conta própria, porque no fim elas que são as verdadeiras merecedoras desse espaço, elas que realmente sabem como crescer por aqui, e eu quero aprender com elas.

Eu não ligava muito pra campo limpo até a quarentena começar e eu resolver me isolar aqui. A grade que separa a casa da vista sempre incomodou minha mãe, e no momento de isolamento que estamos passando, comecei a ver muito mais do que só uma grade, comecei a ver uma grande separação entre o dentro e fora, entre o que a gente carrega, e o que nos é oferecido. 

Olho pras nuvens atrás da grade e penso no Shapiro, e em como do outro lado da grade ele está com os outros mortos, enquanto desse lado estou aqui, aprendendo a multiplicar o que segue vivo, fazendo papel de vento. 

O vento não só tenta equilibrar as coisas como também nos trás presentes, ele faz a mudança de plantas junto das borboletas, aves e animais silvestres. 

Quando o Shapiro morreu senti que devia me reconciliar com o terreno baldio que pertence a minha familia que fica abaixo da casa, queria transforma-lo em uma floresta em homenagem a ele e a todos os bichos que vivem por aqui, incluindo o ser que o matou. O Shapiro agora faz parte desse animal, parte da floresta, e parte das espadas de são jorge e florzinhas amarelas que plantei em cima de sua cova.

Antes eu tinha dó de cortar as flores mais belas dos arbustos, mas depois desse ano, aprendi que é exatamente essa poda que faz com que a planta cresça com o dobro de força. É muito louco que para colaborar no crescimento de uma planta seja necessário cortar suas mais belas conclusões, mas sou uma grande contempladora de flores, e fico muito feliz em saber que posso me presentear com flores enquanto também estou as presenteando com o poder da continuidade da vida.  Se eu não podasse as lavandas, elas não estariam cada vez mais preenchidas cada vez que eu volto, e de quebra perfumo minha casa. 

Sempre me atentei as folhas secas em meus vasos de apartamento, quando vejo que um galho está secando eu o podo, assim a planta foca sua energia em seus novos brotos. 

Tenho podado muitas folhas secas e flores da minha vida. Mas não as de plantas. As folhas secas são mais fáceis, mas as flores ainda doem um pouco. É estranho podar algo que ainda parece vivo, mas os resultados são realmente semelhantes. O meu instinto de poda está cada vez mais afiado, como a tesoura que uso nos meus arranjos.

Contemplo minhas podas porque elas fazem parte da minha história, tudo é aprendizado, mas sou muito grata por ter aprendido isso tão cedo. 

Sou grata em reconhecer que a morte também é energia que se transforma.